Menino do Rio é bem ruim, mas pode fazer rir

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Existiu uma febre de filmes “para jovens” no cinema brasileiro dos anos 80 e boa parte da responsabilidade é o estrondoso sucesso de Menino do Rio, dirigido por Antônio Calmon em 1982. Quem não tinha idade para assisti-lo na época o conhecia de nome.

Não apenas pela trilha com hits como De repente, Califórnia, mas porque Calmon foi trabalhar na Globo. Então, a cada lançamento de coisas como a série Armação Ilimitada (1985) ou novelas como Top Model (1989) e Vamp (1991) a imprensa não se furtava de relembrar suas origens no “cinema para jovens”.

Bem, assistir Menino do Rio hoje é uma experiência dolorosamente longa, mas com muito humor involuntário também. Não dá pra dizer que o filme envelheceu mal, porque acho que aquilo ali sempre foi “o jovem idealizado por gente velha”.
Começa por um logo animado todo neon ao som de rápidos sintetizadores. “Oba, o melhor estilo Xanadu”. Bobagem! Seguem-se longos minutos de silêncio.

Aí vem outro engano: “Olha, A Malu Mader bem mocinha!”. Na verdade é o músico e ator Ricardo Graça Mello (filho da Marília Pêra) fazendo papel de menor abandonado. 
Ele passará as próximas horas (sim, o filme parece que dura umas 8 horas!!!) com um violãozinho te fazendo querer realmente fugir pra Califórnia!
Eita, Serginho Mallandro era bem gatinho, não? Aí ele começa com “ié para mim, ié pra você”...  Exatamente como tem feito nos últimos 40 anos.
O galã, o menino do Rio, é o André de Biasi. Antes que você me pergunte se tá vivo, ele tá no canal do Bispo fazendo novela, até onde sei.
A mocinha é Patrícia, interpretada pela Claudia Magno que anda sempre acompanhada da Nina de Pádua. Já já volto a falar sobre elas!
 Os pais de Patrícia são riquíssimos sim senhor! Tomam Balantines 12 anos, discutem a vida amorosa da filha enquanto olham pro baralho diante de dois figurantes estáticos.
Rico de cinema nacional dos anos 80 você conhece, né? Casa de campo com samambaia na varanda, piscina de azulejo e decoração estilo colonial.
A mãe, aliás, é a sempre maravilhosa Jacqueline Laurence emprestando a costumeira classe a tudo isso. A presença de Laurence nunca é pouca coisa. parabéns já ao filme.

Voltando às duas garotas, depois de um passeio onde conhecem o galã chegam em casa onde os pais olham pro baralho. Eles não jogam, ficam olhando apenas pras cartas nas mãos.
Patricia/Claudia Magno ordena (sim, ordena!) que Nina sirva-lhe um whisky e prontamente é atendida. Nada do Balantines 12 anos, mas J&B, aquele da garrafa verde e rotulo amarelo.

Acabou o filme e não entendi direito quem é a Nina de Pádua na fila do pão. Ela não tem absolutamente função nenhuma além de adular Patrícia. É tipo uma mucama? 

Mas é um filme para jovens e há alguns outros no elenco. Evandro Mesquita da Gaita Infinita e Cissa Guimarães (tão linda, linda) são um casal e, mesmo se eu quisesse, não há mais muito a falar sobre eles.
Ela me causou algumas gargalhadas involuntárias. Fiquei tentando entender se tinha uma interpretação ruim mesmo ou se estava tendo uma interpretação ruim porque o personagem era assim mesmo, viajandona na maconha.
Perceba que o menino é do Rio, mas o elenco todo é branco e alguns loiros. Poderiam ser de qualquer lugar do mundo, até porque, os conflitos deles não vão além de quem fica com quem.
Lembra do menino que parecia a Malu Mader mocinha? Ele está “a perigo” (expressão do roteiro) e fica horas trancado no banheiro com a Playboy, edição da Monique Lafond na capa.
Logo seus problemas acabam. Conhece a Claudia Ohana na praia, que lhe pede fogo pra acender o baseado e ponto! 

Patrícia, a protagonista, tem um namorado rico boboca, o Adolfinho, mas ela gosta, a princípio, de um coroa magnata que depois descobre ser o pai do André de Biasi. Tudo bem, isso vem à baila com relevância só nos momentos finais.

Menino do Rio, pela época, antes do surgimento e propagação da “linguagem MTV”, é ainda cinematograficamente bem careta, poderia dar um desconto ao ritmo arrastado. Ainda assim, é terrivelmente sem graça.
O único lampejo que ele alcança é quando Adolfinho assiste a um filme antigo na TV e imagina os personagens falando do seu relacionamento fadado ao fracasso. Essa participação afetiva de Pedro Paulo Rangel é um sopro de modernidade legítima ali.

Falando em modernidade, Patrícia é modelo. Aí pára tudo para Claudia Magno desfilar os últimos lançamentos da grife Fiorucci e se segure na cadeira porque os modelitos são uma viagem no tempo.
Tão 80’s... Mas infelizmente isso é bem pouco pro filme todo divertir por ser "Tão 80's".

Demora a aparecer maconha, quase não há nudez e sexo (Biasi tem um nu frontal rapidão e com a mocinha encena um Adão e Eva meiguinho que poderia estar numa aula de catequese). "Os jovens" são muito comportados, reacionários, mesmo o Mallandro não passa dos habituais “glu glus”.

Existe uma sequencia de luta, quando o Adolfinho vai tirar satisfação por ter perdido a amada, que parece saída de filme de Didi Mocó. Ele dá socos, o mocinho revida com um único golpe de karatê (!!!) e ponto! Na próxima vez que vemos Adolfinho ele está com a clavícula engessada.
Didi Mocó? Espere pra assistir o final do filme! Sabe quando o roteiro chega a um ponto e entrega pra Deus?
E o Evandro Mesquita da Gaita Infinita? A Ohana? A Cissa? A Malu Mader fake? Não faça perguntas difíceis, eles já enfeitaram a tela, tá bom né?

Tô exagerando, acontece uma tragédia pouco antes do final Didi Mocó, mas é só. O filme é só isso mesmo e aposto que foi o sucesso que foi porque não haviam jovens (de qualquer maneira que fosse) na tela na época.

E o sabor final é bem estranho! Calmon, o diretor, trabalhou com Glauber, tinha trajetória no cinema (inclusive no Cinema Marginal!), fez na TV coisas inovadoras como Armação Ilimitada, assim como a trajetória do produtores Lucy e Luiz Carlos Barreto é de conhecimento geral, mas temos a sensação de que foi feito por quem nunca assistiu cinema na vida.
Poderia ser divertido como comédias sexualizadas tipo Porky’s  ou suspense e terror tipo Sexta-feira 13, pra citar dois exemplos de filmes famosos “para jovens” da época, mas é só gente branca, bem criada cujo único problema na vida é namorar. Não tem eco de nada e isso, no caso, está longe de ser bom!

O filme é para jovens do começo de 1980, mas poderia ser para os jovens de 1880 (lembre-se que há até um tipo de mucama!). Era só trocar o surf e voos de asa delta por passeios de charrete.

Achou ruim? Assista a sequencia, Garota Dourada de 1984 também do Calmon! Mesmos personagens, mesmos probleminhas, mas agora com UFOs...

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2Comentários

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  1. Rapaz! Nem lembrava mais desse filme, fiquei com vontade de assistir de novo.....kkkkkk!

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  2. Muito boa e divertida essa sua análise de um filme tão 80's e tão ruim...mas ri bastante e na atual conjuntura isso já é bom.

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