Os Trapalhões Na Terra dos Monstros é o grande filme B ignorado

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 A cinematografia de Os Trapalhões possui duas fases bem distintas: Aquela em que o Didi não ficava com a mocinha no final e aquela em que abundavam artistas agenciados pelo Gugu através da PromoArt. A primeira é inegavelmente superior por vender em primeiro lugar uma narrativa estrelada pelo famoso quarteto cômico.

Os Trapalhões Na Terra dos Monstros de 1989, dirigido pelo ator Flávio Migliaccio fica entre esses dois mundos, mas foi além, levando as telas um raro filme brasileiro de monstro que ainda registrou uma antiga lenda local. A Perda da Gávea, principal cenário, seria a prova da chegada dos Fenícios à Cidade Maravilhosa milhares de anos antes dos portugueses. 
Essa lenda já havia sido parte fundamental da trama de Roberto Carlos e o Diamante Cor-de-rosa dirigido por Roberto Farias em 1970, outro sucesso do nosso cinema popular. Mas focando no filme dos Trapalhões, todo o roteiro de Paulo Andrade e Mauro Wilson sob argumento do Renato Aragão é escrito em cima disso.

A montanha seria uma misteriosa esfinge que de dia lembraria um gentil rosto jovem e ao entardecer viraria um idoso triste.  Localizada entre os bairros cariocas São Conrado e Barra da Tijuca, a Pedra da Gávea possui ainda marcas visíveis próximas ao  "rosto" que para muitos são um tipo de escrita antiga (ou uma simples erosão?).

O roteiro do filme faz proveito da teoria de que no interior desse montanha existe um portal para um enorme mundo subterrâneo (há farto material a respeito na internet em páginas sobre mitos e lendas).  Enfim, Os Trapalhões Na Terra dos Monstros é um filme fantástico sobre folclore de uma região do país desconhecido por boa parte do Brasil.

Mas é também um dos primeiros flertes de Os Trapalhões com a PromoArt, como já lembrei ali no começo deste texto. Há tanta coisa bizarra (pra dizer o mínimo) que eclipsa qualquer milenar mistério Fenício.
Os créditos iniciais é com uma animação sem relação alguma com a história, que se passa nos bastidores do filme. Dirigida por Cesar Sandoval, o mesmo responsável pelo Gibi dos Trapalhões na Editora Globo, foi difícil oportunidade de se assistir a uma animação brasileira naquele tempo.
Aparecem alguns anúncios do pó químico refresco Royal e os super heróis criados pela marca têm até papel importante na historieta.  Didi e sua turma são associados ao concorrente Frisko, o refresco da Arisco (pelo menos na minha cabeça), mas cinema é uma coisa cara, né?
Depois ainda é a vez do mini Didi em desenho aparecer em nu frontal após ser atacado por fãs. E finalmente começa o filme direto no palco do Viva À Noite, atração comandada pelo Gugu no SBT, e logo de cara somos apresentados ao grupo Dominó que acaba de se apresentar.
Sai Dominó entra A Galinha Azul Maggi cantando seu jingle (abre as asas e dê uma ciscadinha). Não havia a menor preocupação com produtos super industrializados ou o consumismo infantil naquela época. Minha nossa senhora da hiper inflação!

Só depois o apresentador apresenta Angélica cantando Nosso Amor é Uma Festa, faixa esquecida lá quase no final do lado B do seu primeiro disco (aquele que tinha Vou de Taxi). Angélica se chama Angélica, se parece com a Angélica, é apresentada num programa famoso de TV como sendo Angélica, mas ela não é Angélica.
Aqui ela é a filha de um magnata ganancioso que fica horrorizado com a filha preferir ser artista do que dirigente das suas empresas.  O homem tem tanta visão administrativa que contratou Dedé, Mussum e Zacarias para trabalharem em sua casa.
Enquanto isso, nosso herói, o cantor Conrado (atual participante de reality show, casado com uma ex Paquita, sabe?) chega ao Rio de Janeiro e pega o taxi do Didi. O taxi do Didi é tipo o Mambo Taxi do filme do Almodóvar do ano anterior, tem de tudo à disposição do cliente.
Como 9 entre 9 filmes brasileiros para as crianças há uma mensagem ecológica e além de ser cantora a Angélica vai contra os interesses do pai ao participar de passeatas a favor da natureza. Ele tem uma fábrica de papel que "precisa cortar centenas de árvores por dia" (reflorestamento? Reciclagem?).

Enfim, a loirinha pede no Sonho Maluco (quadro do Viva à Noite em que anônimos realizam desejos esdrúxulos com famosos tipo amarrar a Mara Maravilha em para-choque) para gravar um clipe na Perda da Gávea com o grupo Dominó. Pai não deixa ela foge com o Conrado depois de ouvi-lo cantar  um dos números musicas obtusos e desnecessários.

E aí descobrimos algo muito estranho. O saudoso Bocão, aquele mascote das gelatinas Royal, mora no quarto da garota a troco do quê? (já contabilizou quantas marcas e produtos aparecerem logo nos primeiros minutos?).
Bom, e a partir daí entra a parte bacana. Logo quase chegando à Pedra da Gávea os Trapalhões (enviados pelo magnata para resgatar sua filha) encontram um velho barbudo que lhes conta sobre a vinda dos Fenícios e seus perigos.  Eles vão até a “cabeça” da pedra para salvar o casalzinho e entram numa outra dimensão.

Angélica e Conrado já estão lá de boas convivendo com os Grunks, monstros meio Eoks meio Gremlins. Muito bem produzidos, embora o zíper fique sempre aparente nas costas dos anões.
Além dos Grunks há um monstro gigante bonzinho que parece idoso e bem sábio, o que não é comum em produções infantis ocidentais. Ele lembrava o Jabba the Hutt antes deste passar pelos retoques digitais e andar.
E ainda os perigosos Barks, criaturas de corpo realmente legal, muito bem excetuados, lembrando O Monstro da Lagoa Negra. Pena que sua função na história não é satisfatória, girando em torno de como nossos heróis conseguirão sair daquele universo místico.
Descobrem também uma civilização perdida do qual a expressiva Cira, “interpretada” por Vanessa Oliveira (cujos créditos iniciais fizeram questão de frisar ser “Top Model” da marca Dijon) é a líder.  Precisa dizer quem será o interesse amoroso do Didi ?
Os Trapalhões na Terra dos Monstros ocupa a 45ª posição na lista de maiores bilheterias do cinema brasileiro. Um total de 3200 milhões de espectadores de acordo com a lista da Agência Nacional do Cinema (ANCINE) e o site FilmeB.

Merecia um remake com efeitos melhores e um roteiro mais alinhado, sem tanto lenga lenga. Se bem que, com uma bilheteria colossal dessas, não dá pra dizer que há algo a ser consertado no seu roteiro...

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2Comentários

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  1. Adorei esse post. Esse é um filme q já faz parte da minha coleção e sempre procuro os demais dos Trapalhões, mas infelizmente fazem parte dos típicos clássicos brasileiros bem complicados de achar...

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  2. Assisti só uma vez. Dá última leva de filmes com o quarteto original, o único que gostei foi o Casamento dos Trapalhões. Esse dos monstrinhos e os demais que vieram são esqueciveis. Parabéns pelo texto.

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