Tudo teria começado porque Miriam Hopkins encanou que Bette estava
apaixonada por seu marido, o diretor Anatole Litvak. Para azedar ainda mais, Bette havia ganhado o Oscar por Jezebel (1938 de William Wyler), papel que Hopkins
havia interpretado com sucesso no teatro e esperava ser chamada para o filme.
Contratadas pela Warner e mantidas pelo estúdio como grandes
estrelas, ambas foram escaladas para Eu Soube Amar (The Old Maid, 1939 de Edmund
Goulding). Todos sabiam da rixa entre elas e esperavam as obvias faíscas.
Logo de cara Bette Davis percebeu que a colega estava interpretando
de forma muito mais suave e gentil do que o papel pedia, e encarou isso como
uma forma de conquistar a simpatia do público, roubando-lhe o filme. Hopkins ainda
acentuou seu sotaque natural do sul, para realçar o falso da rival.
Como de praxe, negavam publicamente qualquer problema entre
elas. Com bom humor aceitaram, inclusive, posar para a publicidade usando luvas
de boxe.
Quatro anos depois foram novamente escaladas para Uma Velha
Amizade (Old Acquaintance, 1943 de Vincent Sherman). Bette ficou possessa em
ter que dividir novamente os sets com a
outra, mas teve que concordar que ela era o melhor nome para interpretar uma “bitch”.
Já Hopkins, que mesmo tendo se tornado uma estrela de menor
peso, fez uma série de exigências, inclusive um salário maior que o da inimiga,
aquela altura um dos principais nomes femininos de Hollywood (e o primeiro a aparecer nos créditos dos dois filmes que elas estrelaram). Muito mais armada desta vez, foi trabalhar desde
o primeiro dia disposta infernizar o máximo que podia.
Para espanto geral chegou vestindo seu antigo figurino de
Jezebel nos palcos, aquele vestidão vermelho. Bette Davis dando baforadas viu logo que as
filmagens seriam longas e duras como rocha.
O que ela passou nas filmagens de Uma Velha Amizade foi
único em sua extensa carreira. Nem Joan Crawford fez um terço durante O Que
Aconteceu com Baby Jane? (What Ever Happened to Baby Jane?, 1962 de Robert
Aldrich).
Todas as tomadas que as duas conversavam e a câmera estava
no ombro de Miriam mostrando Bette, Miriam acendia um cigarro, passava o
isqueiro pelo rosto da colega, olhava em outra direção. Em planos que estivesse
fora não ficava para dar o contraponto, ia arrumar as almofadas do sofá, se
abaixava pra catar no chão algum grampo imaginário.
Quando Bette Davis (conhecida por primar pelo
profissionalismo) reclamava, docilmente lhe dizia que ninguém estava olhando
pra ela mesma. Foi reclamar ainda ao diretor que Davis estava ganhando muito
mais closes que ela, Vincent Sherman lhe garantiu que mesmo se fosse sua mãe
ali, só receberia os closes necessários a contar a história.
Assumindo a má vontade passou a fingir que sofria de surdez
toda vez que Bette falava alguma tirada ácida contra ela. Abria a bolsa e
pegava um aparelho auditivo e depois lamentava ele não funcionar.
Numa tarde Bette Davis passa por uma loja de discos e vê a
trilha sonora do filme: fica não menos que histérica com a Warner! Disse que
jamais autorizou aquela capa, que a letra sobre a imagem dava a entender que
ela faziam papel de lésbicas apaixonada.
E assim ficou semanas a fio reclamando do suposto
lesbianismo. De qualquer forma, não existe vestígio daquela capa hoje em dia na
internet.
Tensa, algumas vezes Bette teve o ímpeto de esbofeteá-la e
ela não se mexia, apenas virava o rosto dando a outra face. Bette comentou em
alto em bom som que a rival havia interpretado uma cena como um cadáver e no
outro dia lá estava Hopkins no estúdio vestida de luto dos pés a cabeça.
Miriam Hopkins teve que interpretar uma longa sequencia
melosamente dramática e Bette ficou nos bastidores narrando baixinho como se
fosse uma corrida de cavalos. Numa manhã Hopkins estava tão nervosa que
escorregou no sabonete ao sair do banho, bateu a cabeça tendo que levar pontos
na orelha, sem dúvida saiu espalhando que foi Bette quem havia posto aquele
sabonete ali.
Chegou dia de filmar a grande cena, talvez a mais famosa do
filme, em que Bette Davis furiosa chacoalharia Hopkins pelos ombros e a jogaria
num sofá. Foi um grande evento! Todo o elenco, mesmo os que não tinham nada a
fazer naquele dia, apareceram ao set, técnicos de todos os filmes que estavam
em produção também foram pra lá ver.
E não foi fácil! Poucos segundos levaram a tarde toda para
ficarem prontos porque Hopkins amolecia o corpo pra outra não conseguir lhe
sacudir. Bette protestou que assim era impossível, o diretor pediu “pelo amor
de Deus” para Hopkins brigar e ela disse: “Mas estou brigando com Bette”.
Bette Davis vendo que havia uma plateia extra tratou de
provocar a rival para ela gritar, coisa que não conseguiu, pelo menos ali na
frente de todo mundo. Dizem, segundo o biografo Charles Higham de Bete Davis, que
em casa Hopkins berrou a todos os pulmões para quem quisesse ouvir sua raiva.
Com tudo isso, mais o texto sendo constantemente reescrito,
muitas vezes a pedido de Bette Davis, a rodagem conseguiu ficar nada menos do
que 36 dias atrasada. As atrizes ainda começaram a faltar alegando vários
problemas de saúde, as vezes as duas ao menos tempo.
E ainda assim o filme foi um grande sucesso daquele ano, o
mais comentado antes de ficar pronto. Todas as desavenças ficaram públicas e
notórias o que levou o público a ir ao cinema como quem vai assistir a um
campeonato de pugilistas.
Veja também:
Com a maldade na alma: Joan Crawford por Bette Davis
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Com a maldade na alma: Joan Crawford por Bette Davis
Essa história que você contou na matéria sera contada na mini-série ‘Feud’ e as grandes divas do passado serão interpretadas pelas divas atuais Jessica Lange e Susan Sarandon, liderando um elenco que também inclui Alfred Molina, Stanley Tucci, Judy Davis e Dominic Burgess. Vai contar a história da rivalidade lendária entre duas das maiores estrelas do cinema de todos os tempos – Joan Crawford (Lange) e Bette Davis (Sarandon), e como elas se uniram em 1962 para colaborar em um filme que cada uma esperava reviver, assim, suas carreiras.
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